O objetivo da primeira postagem sobre o acordo entre os governos brasileiro e o português era apenas de informar uma notícia, um pouco antiga pois o documento parece ter sido assinado em outubro de 2012.
Mas, depois dos comentários deixados pelo arquiteto Marcelo Lorenzati autor do blog O Lápis Verde, (a quem agradeço o cutucão) me vi convocado a emitir minha opinião sobre o assunto.
Causou-me estranheza o acordo entre os dois países.
Tentarei explicar nas linhas a seguir minha reação.
Fiz parte na UEG , Universidade Estadual de Goiás, durante dois anos de uma comissão para validação de diplomas. No período analisamos dois processos, um europeu e outro latino americano.
Hoje na UFG faço parte também de outra comissão para a mesma
tarefa, ou seja comparar as matrizes curriculares, apontar necessidades de
complementação de formação e segundo as normas validar ou não os diplomas.
Atualmente temos dois processos da América Latina em análise.
A Resolução N. 8, de 4 de outubro de 2007 do Ministério da
Educação, além das diretrizes internas da Instituição de Ensino Superior,
norteiam as decisões da comissão.
A principal delas está no artigo 6.
A comissão de que trata o artigo anterior deverá examinar, entre outros, os seguintes aspectos:
I – afinidade de área entre o curso realizado no exterior e os
oferecidos pela universidade revalidante;
II – qualificação conferida pelo título e adequação da documentação que
o acompanha; e
III – correspondência do curso realizado no exterior com o que é
oferecido no Brasil.
Parágrafo único. A comissão poderá solicitar informações ou
documentação complementares que, a seu critério, forem consideradas
necessárias.
Vejo com estranheza o acordo entre Brasil e Portugal para os cursos de engenharia e arquitetura, porque o processo como está estabelecido na resolução citada indica ser o caminho mais coerente, pois precede à validação uma análise de conteúdos e de áreas.
Primeiro é preciso considerar o que cada país e seu ensino da profissão entendem por arquitetura e urbanismo. Temos que lembrar que no Brasil a formação é dupla, em arquitetura e urbanismo e algumas escolas do mundo formam profissionais nas duas grandes áreas de atuação. Segundo é preciso respeitar as especificidades da formação brasileira. As questões bioclimáticas, tecnológicas, culturais e históricas. Terceiro é preciso lembrar das questões de relativas ao exercício da profissão.
Nossa história recente de emancipação de um conselho multiprofissional é novidade para a maioria dos arquitetos formados em outras partes do mundo.
De acordo com as experiências vividas na comissão da UEG, os candidatos apresentam de uma maneira geral uma formação muito semelhante à do Brasil, considerando é claro as Diretrizes curriculares Nacionais e o Projeto Pedagógico do Curso de Arquitetura de cada instituição.
Se olharmos para a estrutura do ensino superior em arquitetura e urbanismo apontada pelas diretrizes curriculares nacionais veremos a seguinte estrutura em seu artigo 5:
O curso de Arquitetura e Urbanismo deverá possibilitar formação profissional que revele, pelo menos, as seguintes competências e habilidades:
I - o conhecimento dos aspectos
antropológicos, sociológicos e econômicos relevantes e de todo o espectro de
necessidades, aspirações e expectativas individuais e coletivas quanto ao
ambiente construído;
II - a compreensão das questões que
informam as ações de preservação da paisagem e de avaliação dos impactos no
meio ambiente, com vistas ao equilíbrio ecológico e ao desenvolvimento
sustentável;
III - as habilidades necessárias
para conceber projetos de arquitetura, urbanismo e paisagismo e para realizar
construções, considerando os fatores de custo, de durabilidade, de manutenção e
de especificações, bem como os regulamentos legais, de modo a satisfazer as
exigências culturais, econômicas, estéticas, técnicas, ambientais e de
acessibilidade dos usuários;
IV - o conhecimento da história das
artes e da estética, suscetível de influenciar a qualidade da concepção e da
prática de arquitetura, urbanismo e paisagismo;
V - os conhecimentos de teoria e de
história da arquitetura, do urbanismo e do paisagismo, considerando sua
produção no contexto social, cultural, político e econômico e tendo como
objetivo a reflexão crítica e a pesquisa;
VI - o domínio de técnicas e
metodologias de pesquisa em planejamento urbano e regional, urbanismo e desenho
urbano, bem como a compreensão dos sistemas de infraestrutura e de trânsito,
necessários para a concepção de estudos, análises e planos de intervenção no
espaço urbano, metropolitano e regional;
VII - os conhecimentos
especializados para o emprego adequado e econômico dos materiais de construção
e das técnicas e sistemas construtivos, para a definição de instalações e
equipamentos prediais, para a organização de obras e canteiros e para a
implantação de infraestrutura urbana;
VIII - a compreensão dos sistemas
estruturais e o domínio da concepção e do projeto estrutural, tendo por
fundamento os estudos de resistência dos materiais, estabilidade das
construções e fundações;
IX - o entendimento das condições
climáticas, acústicas, lumínicas e energéticas e o domínio das técnicas
apropriadas a elas associadas;
X - as práticas projetuais e as
soluções tecnológicas para a preservação, conservação, restauração,
reconstrução, reabilitação e reutilização de edificações, conjuntos e cidades;
XI - as habilidades de desenho e o
domínio da geometria, de suas aplicações e de outros meios de expressão e
representação, tais como perspectiva, modelagem, maquetes, modelos e imagens
virtuais;
XII - o conhecimento dos
instrumentais de informática para tratamento de informações e representação
aplicada à arquitetura, ao urbanismo, ao paisagismo e ao planejamento urbano e
regional;
XIII - a habilidade na elaboração e
instrumental na feitura e interpretação de levantamentos topográficos, com a
utilização de aerofotogrametria, fotointerpretação e sensoriamento remoto,
necessários na realização de projetos de arquitetura, urbanismo e paisagismo e
no planejamento urbano e regional.
A resolução n. 8, já mencionada, oferece duas alternativas para que o profissional possa suprir as demandas de conteúdo: cursar disciplinas para complementar a formação ou ser submetido à exame que contemple todo o conteúdo específico apontado pela comissão. Dependendo do caso cursar as disciplinas parecem ser o caminho mais indicado.
Parece estranho, mesmo para países com a mesma língua, um profissional formado em Portugal ter seu diploma reconhecido de forma automática aqui no Brasil. A estranheza permanece se eu pensar na via contrária, um brasileiro tendo seu diploma reconhecido sem uma análise prévia, por comissão especializada, de sua formação profissional.
Acredito ser a Universidade o local legítimo para a validação. Compete a professores de ensino brasileiros dizer se o profissional formado em outro país tem conhecimento específico para obter uma validação de diploma brasileiro.
Muito bem até agora falamos de formação profissional e validação de diplomas. Mas obter o registro no Conselho de Arquitetura e Urbanismo para exercer a profissão passa por outro processo dentro de cada CAU dos estados. Segundo diretrizes do CAU BR na resolução 18, os profissionais serão registrados conforme a característica da formação de sua instituição de ensino ou da instituição que validou o diploma.
Veja o
artigos 8° e 9° da resolução.
Art. 8° A Comissão Permanente de
Ensino e Formação Profissional do CAU/UF, em função da análise da qualificação
acadêmica do portador de diploma ou certificado, concederá o registro em
conformidade com o currículo de formação escolar.
Art. 9° Caso seja necessário
confirmar a autenticidade do diploma ou certificado, o CAU/UF solicitará à
instituição de ensino superior expedidora do documento a emissão de prova, por
meio de atestado digital com certificação do emitente, que deverá ser
acompanhada do original do diploma.
Estive presente como conselheiro suplente em uma
reunião da Comissão de Ensino em maio deste ano no CAU GO e pude ver um
processo de um arquiteto que solicitava o registro profissional.O CAU BR emitiu
uma diretriz através de uma planilha bastante completa, para validar e conceder
o diploma conforme a formação estabelecida. Toda as informações deverão ser
comprovadas pelo profissional solicitante.
Assim acredito que mesmo o governo brasileiro fechando
tal acordo de validação automática de diplomas – o que não posso concordar por
entender que há diferenças cosideráveis em relação à formação de arquitetos e
urbanistas no mundo inteiro – a concessão de registro profissional passa pelo
crivo do CAU. Cabe a nós arquitetos cobrarmos dos nossos conselhos e do CAU BR
ações que estabeleçam claros critérios de emissão de tais registros
profissionais.
Obrigado Mestre
ResponderExcluirSabia que podia contar com sua lucidez, sei que tomará isso como bandeira, não para impedir bons profissionais de atuarem no Brasil, não como revanchismo; mas como baluarte da justiça no CAU, independente dos desmandos políticos, demagógicos, populistas e diplomáticos de quem possui o poder mas não a competência para tal.
Abraços de seu (abusado) aluno
Tão legal teu blog! Na verdade,nem sei como vim parar nele, foi numa pesquisa sobre outra coisa, rs..
ResponderExcluirTinha que colocar uma faixa de assinante aqui do lado, pra poder receber os posts por email. ;)
Oi Maressa.
ExcluirQue bom que gostou do blog.
Fico feliz em saber que nosso trabalho ajuda as pessoas.
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Abraço.